Uma pesquisa divulgada recentemente aponta que influencers negros ganham menos que brancos e, quando são requisitados para trabalhos, majoritariamente é para falar sobre raça e assuntos correlatos.
O estudo “Black Influence: Um retrato dos creators pretos no Brasil”, realizado em conjunto pelo Black Influence, Site Mundo Negro, YOUPIX, Squid e Sharp, entrevistou mais de 700 criadores de conteúdo no Brasil com o intuito de investigar o mercado de influência no país e mapear os efeitos do racismo estrutural sobre à população negra.
O perfil dos criadores de conteúdo revela que a faixa etária predominante é entre 26 a 35 anos (52%), composta por mulheres cisgênero (72%) e brancos (56.8%). O contingente de pardos (22%), pretos (17%) e indígenas (0,9%) é menos da metade quando comparado ao dos brancos.
No que se refere à remuneração por trabalhos, a disparidade entre brancos e negros chega a 51,1%, como mostra o gráfico abaixo. A discrepância, no entanto, é ainda mais profunda ao se analisar os dados de criadores de conteúdos indígenas, que recebem até 66,2% a menos do que os brancos, raça que é melhor paga.
Para Lara Lages, jornalistas e líder de projetos na Sharp, as desproporções reforçam que o mercado não trata de maneira igualitária criadores brancos e não brancos. “Ao comparar a média dos valores mínimos e máximos que os creators receberam em campanhas, pode-se perceber uma disparidade entre as raças. As principais diferenças acontecem nos valores máximos nas raças preta e indígena, as quais receberam um valor máximo médio inferior em mais de 50% que a média da pesquisa”, explica.
A pesquisa mostra que 60% dos criadores considera o mercado de marketing de influência inclusivo. Entretanto, quando considerados só influenciadores que se autodeclaram indígenas e pretos, apenas 29% e 36%, respectivamente consideram o mercado como inclusivo.
O criador de conteúdo baiano Rick Trindade, 29, formado em Rádio e TV, ilustra como as interseccionalidades de ser um homem negro, gordo e nordestino reverberam na escolha de contratos de trabalho. “Isso tudo já é motivo suficiente para não ser nada fácil”, declara.
“Vivemos numa sociedade racista, gordofóbica, e que o Nordeste geralmente é excluído de muitas coisas. Eu consegui crescer nas redes sociais de maneira orgânica. Hoje, apesar de morar no Nordeste, eu estou muito inserido no Rio de Janeiro. Por um lado isso é bom porque eu faço contados, por outro, eu continuo no Nordeste e algumas portas ainda não se abrem”, explica Rick Trindade que soma mais de 20 mil seguidores em suas redes.
A seletividade do mercado
De acordo com a pesquisa, os influencers negros também são mais chamados para fazer trabalhos que envolvam temas relacionados à raça. “Quando falamos de pluralidade no mercado, queremos ver pessoas de todos os jeitos levantando os temas que lhes interessam sejam finanças, moda, bem estar”, argumenta Lara Lages. Para ela, confinar produtores de conteúdo negros no lugar de só poder falar de racismo, restringe-se e violenta-se ainda mais este público que é diverso e habilitado a discorrer sobre quaisquer assuntos.
Rick Trindade ressalta que no mês de novembro o mercado lembra que negros existem, porém no restante do ano ficam em segundo plano. “Em Novembro não faltam convites para produtores de conteúdo e influenciadores negros e negras, para falar justamente sobre dor, sobre racismo. Nossa dor gera audiência. Acho que de forma geral, a sociedade gosta de enxergar a gente nesse lugar de sofrimento”, avalia.
A pesquisa é inédita no Brasil e evidencia a desvalorização que criadores de conteúdo negros sofrem. A expectativa, no entanto, é que o cenário mude. Segundo Monique Evelle, sócia da Sharp: “A gente só consegue pensar em soluções quando temos diagnóstico em mãos. Ainda bem que estamos criando esse diagnóstico. Agora não existirá desculpa para o mercado de influência poder atuar para equidade racial e de valores nos trabalhos dos influenciadores negros”, conclui.