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Conheça a história do bailarino negro baiano que dança sua trajetória na Inglaterra

Foto de capa: Sergei Korotkov.


Larissa Carvalho, Negrê

Natural de Salvador (BA), José Alves, 30 anos, iniciou seus estudos em ballet clássico aos 13 anos de idade na Escola de Ballet Adalgisa Rolim, na Capital baiana. “Sempre digo que o balé me escolheu e não eu a ele”, diz o baiano negro a respeito de sua relação com a dança clássica. Hoje, ele trabalha na Ballet Black Company, em Londres (Inglaterra), e faz parte da plataforma que dá visibilidade aos bailarinos pretos ao redor do mundo, Blacks in Ballet (BIB).

“Você pode sim ir em sentido contrário do rótulo que a sociedade já implantou”. É o que diz o baiano, que mora no exterior há nove anos, em entrevista cedida à reportagem do Site Negrê para a editoria Vozes nesta quinta-feira, 24. Confira os detalhes a seguir e conheça sua história de perto:

Negrê – Como e quando você decidiu estudar ballet clássico? Como foi esse processo de encontro com a dança na sua vida?

José Alves – Eu sempre gostei de me movimentar desde os 6 anos de idade. Lembro que tinha um espelho bem velhinho na sala de casa, que eu ficava me olhando e dançando em frente. Comecei a participar de grupos de dança que tinha na escola do projeto da prefeitura (Esporte Cidadão). Absolutamente, qualquer projeto que tinha na escola eu estava dentro, sendo dança ou teatro. Eu comecei o balé quando eu tinha 13 anos de idade na Academia de Ballet Adalgisa Rolim. Antes desse amor a primeira vista acontecer, eu levava minha irmã para a escola regular, onde tinha aulinhas de balé. Um belo dia, eu sentado esperando, perguntei a professora se eu poderia tentar e ela me deixou. Foi daí que me despertou o desejo pelo balé. Sempre digo que o balé me escolheu e não eu a ele. Porque venho de uma família completamente tradicional e menino de uma família tradicional escolher dançar bale era/é um insulto. Mas fui no contra mesmo sem dar ouvidos aos zombadores que são de milhões… Porque aquele amor, aquele desejo de seguir essa carreira ardia tanto em meu peito, que ninguém já mais iria me parar e até hoje. Ah… como sou grato a Deus por ter me colocado nesse caminho.

N – Então você decidiu que a dança ia fazer parte da sua vida muito cedo, né… então, como foi sua trajetória com a dança na sua cidade natal e pelo o Brasil em si?

J.A. – Sim! Mas nunca pensei em me tornar um profissional na área da dança. Eu dançava porque eu me sentia e me sinto bem… Era o momento que eu conseguia me sentir livre, o momento que eu entrava em minha bolha e ninguém conseguia furar. (Risos).

N – E quando e como começou esse processo de querer se tornar um profissional de dança? Você recebeu apoio de alguma forma da família? Como você levou isso a frente?

J.A. – Eu entrei para o balé em 2003 na Academia de Ballet Adalgisa Rolim, onde permaneci até 2006. Foi quando fiz a primeira audição do Bolshoi e fui selecionado. Foram mais de 800 candidatos, somente 10 passaram e fui um deles. Eu nem acreditei. Mas minha esperança era tão grande de alcançar algo mais a frente que eu cheguei para a audição às 7 horas da manhã e só fui sair 21 horas da noite. Chegando em casa mais de meia-noite. Fui para o Bolshoi em 2007, onde me formei em 2008. Depois disse voltei para Salvador, viajei para São Paulo e Rio de Janeiro naquele ano de 2009 para audições, quando fui selecionado em uma audição que fiz em SP para o Boston Ballet, em Massachusetts (EUA). Mas tive o meu visto negado, e não consegui patrocínio… tudo isso derrubou o meu chão. Fiquei muito desmotivado por um tempo… mas depois a chama se acendeu novamente e eu retomei. Em 2010, fui selecionado para o YAGP [Youth America Grand Prix] em Nova Iorque (EUA), onde recebi a bolsa para o Royal Ballet da Nova Zelândia… Novamente, não consegui arrecadar fundos para dar continuidade ao meu sonho. E do Brasil, não tive sequer 1 real tanto de político ou patrocinadores e sim da minha querida e amada professora Adalgisa Rolim.

“Eu dançava porque eu me sentia e me sinto bem… Era o momento que eu conseguia me sentir livre”. Foto: Karol Omorczyk.

N – Desde cedo, você foi buscando seu caminho e encontrando dificuldades e desafios também… o que você dizia a si mesmo para não desistir? Como você se motivava quando os objetivos iam sendo frustrados de alguma forma?

J.A. – A vida é isso… Os obstáculos são extremamente necessários para fazer o ser humano que somos hoje. E morremos aprendendo. Eu sempre fui focado nos meus objetivos… Ao ponto de nem a minha mãe eu ouvir. Quando ponho algo em minha cabeça, eu vou até o fim… Posso chegar na reta final suando sangue, mas eu chego lá. Minha motivação e força sempre foi Deus pra te falar a verdade. Mas, as fitas cassetes que eu tinha ou DVD de ballet que me incentivava a não desistir. Sob a luz da fama (2000), aquele Giselle bem velhinho com a Carla Fracci e o Corsário do American Ballet Theatre (EUA) que me motivava muito! Aquela chama ardia, vinha à tona como um vulcão quando eu assistia esses vídeos.

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N – Percebo que as oportunidades no ballet clássico surgem mais para quem é da região Sul e Sudeste do Brasil… como negro e nordestino, você acha que teve um pouco mais de dificuldade para conseguir uma oportunidade no exterior? Como você se sente diante disso?

J.A. – Disso sem dúvidas! Eu nunca tive um físico fácil… mas o que tinha e tenho me serve muito bem. Foi muito difícil e triste ter batido em tantas portas daí do Brasil e não ter tido nenhuma oportunidade. Mas pra ser sincero, sempre tive essa visão de morar fora. Então, mandei meus materiais para algumas companhias na Alemanha e Polônia, foi onde consegui um contrato na Polônia. Um negro nordestino em uma companhia polonesa. Mas depois de um ano lá, fiz uma audição para o Ballet Black Company, onde atuo hoje em Londres.

N – O que você diria para quem deseja seguir a carreira de bailarino clássico como profissão? Como resistir ao não apoio da família e as dificuldades no Brasil principalmente quando se é negro e nordestino?

J.A. – Eu diria: Seja sempre você! E por mais que as circunstâncias digam que não, você pode sim ir em sentido contrário do rótulo que a sociedade já implantou. E muitas vezes, isso significa ir em sentido contrário do que sua família quer para você ou para a sua carreira. Você só tem que seguir os seus instintos, manter a fé, o foco e a determinação. Isso serve não só no mundo do balé, mas pra qualquer sonho que você possa ter. Nunca pare de lutar e nunca desista!

Foto de capa: Sergei Korotkov.

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