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As candidaturas femininas bateram recorde histórico em 2020, com 182 mil mulheres postulando cargos nas prefeituras e câmaras municipais do Brasil Foto: Agência O Globo

Sociedades

Cinco motivos para votar em mulheres nessas eleições

Desde a necessária representatividade até o maior diálogo com a sociedade civil, cientista social Beatriz Della Costa Pedreira enumera, a partir de estudo que analisou o trabalho feito por uma centena de mulheres eleitas na América Latina, cinco razões para se votar em candidatas nas eleições municipais

Leda Antunes, Celina

As mulheres são, há alguns anos, a maioria do eleitorado brasileiro. Mesmo assim, seguem sendo minoria nos espaços de representação política. Apenas dois estados brasileiros são governados por mulheres atualmente e elas são apenas 15% do Congresso Nacional. No âmbito municipal, dos mais de 63 mil prefeitos e vereadores que tomaram posse em janeiro de 2017, apenas 13% eram mulheres.

Com o primeiro turno das eleições municipais chegando neste domingo (15), é possível melhorar esse cenário. As candidaturas femininas bateram recorde histórico em 2020, com 182 mil mulheres postulando cargos nas prefeituras e câmaras municipais.

Mas por que é importante votar em mulheres? Para além da evidente necessidade de se ter a população brasileira — em que as mulheres representam uma fatia de 52% —representada nos espaços de poder, há outros motivos para apostar em candidaturas femininas.

É o que explica a cientista social e diretora do Instituto Update, Beatriz Della Costa Pedreira. Para entender como as mulheres estão mudando a forma de exercer o poder e por que é importante tê-las nos espaços de decisão,  o Instituto Update percorreu seis países da América Latina entre 2019 e 2020 e conversou com 107 mulheres, sendo 96 delas vereadoras, deputadas, senadoras, prefeitas e governadoras, além de onze filósofas, ativistas e acadêmicas.

Espalhadas por México, Brasil, Bolívia, Colômbia, Chile e Argentina, as mulheres entrevistadas no estudo “Eleitas: Mulheres na Política” ocupam todo o espectro político, são de diferentes classes sociais, raças e possuem histórias de vida diversas. O que elas têm em comum é a defesa que fazem da democracia e a consciência do seu papel político enquanto mulher.

— Precisamos votar em mulheres. Mas, antes de qualquer coisa, é necessário qualificar essa representação: as mulheres que precisam do nosso voto são aquelas com consciência de gênero, independentemente do partido em que estejam ou da corrente política que sigam. São mulheres que têm noção da desigualdade e da repressão sofrida em nossa sociedade, mulheres que se candidatam para promover o avanço dos seus direitos e a igualdade como um todo — afirma.

E continua:

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— Então devemos, sim, votar em mulheres, mas antes temos que avaliar a postura das candidatas, suas propostas, identificar se elas defendem uma agenda de transformação ou, pelo contrário, de manutenção dos valores da política tradicional. E temos bons motivos para isso — afirma a pesquisadora.

1. Representatividade e paridade

“Essa é a base de tudo”, diz a cientista social. Ela lembra da baixa representatividade atual e afirma que os números destas eleições, apesar de recordes, ainda são baixos.

— Mesmo que já exista no Brasil uma política de cotas, com 30% das candidaturas reservadas às mulheres, a meta deve ser a paridade, que é a divisão equânime dos cargos políticos entre homens e mulheres — afirma.

Pedreira considera que, enquanto não há no Brasil mecanismos legais ou institucionais que garantam a paridade, é dever dos eleitores votar em mulheres para promover essa representação.

— Na hora de votar, temos que buscar candidatas que realmente representem o povo. Ou seja, eleger mulheres negras, por exemplo, é uma maneira de aumentar a representatividade na política brasileira como um todo, já que eles compõem quase 28% da população.

2. Fortalecimento da democracia

Pedreira explica que aumentar a representatividade, por si só, é uma forma de fortalecer a democracia. Mas não é tudo.

—  As mulheres inovadoras com consciência de gênero trazem à política um elemento fundamental: o diálogo e a busca por consenso. Esse é um dos princípios democráticos mais importantes de todos, ainda que venha sendo deixado de lado. Aqui no Brasil temos muita dificuldade em entender que, acima de tudo, democracia é sobre buscar o consenso — explica.

Pelas entrevistas feitas no estudo do Update, foi possível perceber que essas mulheres compreendem que, para atingir um objetivo comum, para que nossa sociedade seja capaz de promover mudanças duradouras e sustentáveis, é preciso chegar a essa concordância.

— Isso significa inclusive que certas pautas devem ser trabalhadas de maneira transversal, para além das fronteiras partidárias.

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3. Empatia pragmática

Para buscar consenso, a cientista social afirma que a empatia é uma ferramente fundamental. Mas o conceito necessário para isso extrapola a forma genérica. É necessário ter “empatia pragmática”, explica Pedreira.

— É a empatia usada com um objetivo, com uma ferramenta estratégica, enxergando as necessidades de todos os envolvidos em determinada questão e trabalhando para obter uma resposta em comum e em benefício de algo maior. E as mulheres trazem à política o poder inteligente da escuta ativa.

4. Participação da sociedade civil

A partir do estudo “Eleitas: Mulheres na Política”, também foi possível perceber que as mulheres inovadoras estão mais conectadas à sociedade civil, afirma a pesquisadora.

— Elas têm consciência de que não dominam todos os assuntos e de que precisam estar próximas a quem elas representam, às pautas que elas representam, a quem conhece de maneira aprofundada os assuntos das pautas que elas representam. Na maior parte das vezes, isso está ligado à sociedade civil organizada — afirma.

Ela explica que isso se demonstra, por exemplo, quando essas mulheres vão desenvolver políticas de proteção aos grupos LGBT+ e, para isso, convidam organizações que já atuam nesta área para desenhar tais políticas com elas.

— Isso faz com que tenham uma conexão muito forte com a realidade. É uma ruptura com a política encastelada, com a política como negócio.

5. Ética criativa e novas formas de fazer política

As 106 mulheres entrevistadas pelo Update deixam claro: para inovar, é preciso fazer diferente.

—  Um exemplo aqui no Brasil é toda uma vanguarda ligada aos mandatos coletivos e campanhas colaborativas liderada em sua maioria por mulheres. Essa é uma forma clara de inovação política, pois abre a possibilidade de que mais pessoas participem do fazer político através de um único mandato — explica Pedreira.

Ela afirma, porém, que existem outras formas de exercer a ética criativa, citando o exemplo do coletivo chileno Lastesis, que pela coreografia ‘Um violador em seu caminho” rompeu com a forma tradicional de manifestação, injetando música e sensibilidade ao protesto.

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—  O Latesis foi essencial para a paridade ter sido estabelecida na nova Assembleia Constituinte chilena. Da mesma forma, na Argentina, mulheres que lutavam pela descriminalização do aborto construíram uma estratégia inovadora de audiências públicas, confrontando, pelo diálogo, opiniões a favor e contra o tema. Isso manteve o assunto na agenda pública e levou à aprovação da lei na câmara dos deputados. Chamamos de ética criativa porque o fazer diferente é um princípio das mulheres que inovam na política — finaliza.

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