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O que a visita ao programa Câmara no seu bairro lembra a missão constitucional do Poder Legislativo

PORTELA, M.P ;

São Paulo

O Sol levanta e, antes mesmo de iluminar todas as janelas, percebe que milhares de paulistanos acordaram antes dele. A maior megalópole da América do Sul é assim: O fluxo intenso da jornada de trabalho e de estudo leva os cidadãos dessa cidade a levantarem cedo para compartilharem as ruas, avenidas e ciclovias. No caminho, passam por uma série de instituições necessárias para dar pulso a cidade. É preciso que a linha de ônibus funcione, os faróis estejam cirurgicamente alinhados, as linhas metroviárias em funcionamento, o sistema de abastecimento hídrico e elétrico em plena atividade e assim por diante. Discreto em primeiro momento, um edifício no Viaduto Jacareí comporta uma das mais importantes instituições para o bom funcionamento da cidade: A câmara municipal de São Paulo.

A câmara municipal dos vereadores de São Paulo (CMV) possui uma longa história de atuação. A instituição foi fundada em 1560, quando suas funções eram extremamente distintas das atuais e tinha um viés político-administrativo que acoplavam legislativo, executivo e judiciário¹. Viu seu próprio formato, função e escopo se modificarem de acordo com as sete constituições estabelecidas no transcurso da política brasileira, sendo elas as de 1824, 1891, 1934, 1937, 1946, 1967 e , por fim, a de 1988 ². O que vemos de sua atuação cotidiana deriva, portanto, da constituição cidadã de 1988. Em 2015, vale a pena darmos uma pausa e refletirmos: Depois de vinte e sete anos da última constituição, a CMV cumpre sua missão constitucional? E sua campanha institucional mais divulgada, a câmara no seu bairro, é um avanço nesse sentido?

O que unifica a Sociedade

   Perdurar por quatros séculos, ouvir o grito da independência, presenciar a proclamação da República e ainda assim manter a mesma atividade não é fácil de obter. O Poder Legislativo no Brasil não foge à regra. Como definir, então, a missão institucional de um ente deste Poder tão antigo? Cabe voltarmos aos clássicos de nossa política moderna, que são sucintos : O poder do Estado provém do povo, e ao povo deve servir.

O povo tem um instrumento central para direcionar o poder do Estado a sua vontade, isto é, ao máximo bem estar público: A constituição. Nela está definida no Art. 1º, Parágrafo único: Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição ³. Nesse código de leis se encontram os principais contratos sociais que permitem a sociedade ter um horizonte de harmonia. Procura-se reduzir, ao máximo, a complexidade social. Aproximar o “dever ser” com o “ser” para poder, de fato, garantir os direitos fundamentais das mulheres e homens.

A Constituição Cidadã segue o pacto republicano, o qual garante o Estado de Direito e a separação de três poderes harmônicos entre si: O Legislativo, O judiciário e o Executivo. Partes de um ser só, o Estado, cada poder tem em suas funções( ora exclusivas ora em conjunto)  a busca pelo cumprimento missão constitucional. O Título IV, Da Organização dos Poderes, apresenta, iniciando-se no Art. 44, as disposições dos três poderes. Nele se encontra o desenho institucional do poder que interessa em nossa conversa: o legislativo.  Não cabe aqui discorrermos sobre cada artigo e parágrafo. Ter o código em mãos para a consulta e para inseri-lo no cotidiano é o suficiente e o recomendável. Ainda assim, a sociedade brasileira apresenta uma perigosa ignorância em relação à Constituição. Tão perigosa a ponto de nos privar dos direitos individuais e coletivos, garantidos no caput Art. 5º e nos 78 incisos que o compõe:

   Art5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: e nos 78 incisos que o compõe.

    A melhor maneira, portanto, para reduzir a pobreza, a fome, a desigualdade social e muito dos males que afligem a sociedade é trazer à população meios de conhecer sua Constituição. Formas de estimular a Vontade de Constituição. Se o brasileiro acreditasse e visse nesse documento aquilo que nos torna uma unidade política e institucional, as reivindicações por seus direitos tomariam pulso firme. Desse modo, não apenas de fiscalização e criação de leis deve ocupar-se o Legislativo. Trocar conhecimentos para gerar Vontade de Constituição provou-se ser o objetivo extra ( mas não menos importante) de qualquer Ente e Poder do Brasil. A CMV nos apresentou, em 2015, uma via com esse objetivo: O Programa Câmara no seu Bairro.

Deve-se lembrar, antes, que A cidade de São Paulo não é apenas guiada pela Constituição Federal. A vontade de constituição compreende, num segundo momento, dominar também as Leis Orgânicas dos municípios, como está no Caput do Artigo 29:

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          Art. 29. O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos:

Programa Câmara no Seu Bairro

     A Câmara no seu Bairro tem como seu principal objetivo aproximar a população do trabalho legislativo. Prejudicados por um péssimo sistema de transporte metropolitano, os munícipes muitas vezes não conseguem comparecer à câmara para uma sessão pública. O Ente fica insulado. A cada semana, uma das 32 regiões administradas pelas subprefeituras recebe uma sessão pública, onde são discutidos com os moradores os problemas locais. O evento é aberto a todos e a inscrição para as falas é feita no próprio local, no dia da sessão. O programa está regulado no Ato nº 1293/15, estabelecido no dia 25 de fevereiro de 2014. O retorno que a Câmara tem recebido é grande, por vezes 700 moradores participam, todos atentos aos problemas de sua região. A oitava sessão do ano, por exemplo, ocorreu em um Centro de Artes e Esportes Unificados( CEU) na Cidade Ademar, dia nove de maio.  Nela, reuniram-se 500 cidadãos da região da cidade Ademar e de Pedreira. Desses quinhentos, sessenta e quatro, além dos secretários municipais e vereadores, se inscreveram para falar.

A oitava sessão da Câmara no Seu Bairro começa as 9:30. O presidente da câmara, Antônio Donato, toma a palavra. Anuncia os vereadores, secretários, subprefeitos e outras autoridades presentes.  As primeiras falas são deles.  Discursam sobre diversos temas da atualidade no município: A devastação dos mananciais, as ciclovias, a criação de creches, proteção de parques e praças, os piscinões e o sistema de saúde.

Mas estão longe de serem os protagonistas do evento.  É a vez de a população tomar a palavra.

Figuras sobem ao microfone e demonstram sua vontade de Constituição.  Como o Sr. Benetido de Oliveira, indignado com a fala de um vereador presente  acerca de gastos exorbitantes num  parque que não correspondem na realidade. A cada pausa, uma salva de palmas. Benedito sai do microfone  ovacionado,  e algumas autoridades ficam aliviadas. Sem razão: Os seguintes 63 cidadãos demonstraram muito bem como funciona a cidade e os pormenores da política. Recorrentemente se direcionam aos Vereadores.  Diz o Sr. Osvaldir de Freitas, “A falta de áreas disponíveis na nossa região é grave, para implantação de novos projetos de habitação popular. ”, e  assim, apontando mais um problema da região, encerra-se a participação da população.

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Sr. Benetido de Oliveira. Foto Foto: Luiz França / CMSP

Foram apenas setecentos dos duzentos e cinquenta mil habitantes da Cidade Ademar, mas não é justo dizer que a Câmara no seu Bairro não é um avanço incrível para o fomento de cidadania. Se o Direito nasceu para possibilitar a fraternidade e desenvolvimento, a Câmara Municipal de São Paulo deu sua contribuição para a prosperidade do País. A sessão acaba, pronta para ir semana seguinte ao Butantã ouvir mais munícipes, que paulatinamente, levam para sua vida a vontade de Constituição.

Referências e Bibliografia

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¹ Ordenações Filipinas, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 1985; Livro I, p.144 e 145

²    HISTÓRIA DA CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO PAULO

( http://www.camara.sp.gov.br/institucional/historia-da-camara/ )

³ BRASIL. Constituição Federal. Brasília: Senado ,2014.

Ato nº 1293/15 (http://www2.camara.sp.gov.br/DCE/Ato%20n%C2%BA%201293.pdf)

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