Estudo do Itaú Cultural revela que metade dos postos deixou de existir com a pandemia; economia criativa como um todo ficou sem 10% de seus empregos
Por Giuliana de Toledo, do O Globo
SÃO PAULO – Um estudo divulgado pelo Itaú Cultural nesta quinta-feira (26) revela que metade dos postos de trabalho ocupados por profissionais especializados da cultura deixou de existir entre junho de 2019 e o mesmo mês de 2020. Os empregados no setor caíram de 659,9 mil para 333,7 mil — uma redução de 49%.
— Essa queda, de quase 50%, é dramática — diz Eduardo Saron, diretor do Itaú Cultural. — Ela mostra o impacto da pandemia nas linguagens artísticas, como cinema e teatro.
Olhando para cada atividade separadamente, o drama fica mais nítido. O mercado editorial perdeu 76,85% de seus postos de trabalho no período analisado pela pesquisa. Foram 7.994 empregos a menos. As atividades artesanais também foram pegas em cheio: despencaram 49,66%, ficando sem 132,8 mil postos. As artes cênicas e artes visuais reduziram 43% (97.823), enquanto cinema, música, fotografia, rádio e TV perderam 38,71% (43.845).
Além dessas posições, o levantamento observa profissionais criativos incorporados em outras indústrias (perderam 15,34% de seus postos) e também quem faz atividades de apoio (a perda para eles foi de 9,78%), caso, por exemplo, de um advogado que trabalhe em uma produtora de cinema.
Crise na economia criativa
O estudo, realizado pelo Painel de Dados do Observatório Itaú Cultural, usa como base os dados da Pnad Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua), do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
A economia criativa como um todo perdeu quase 10% de todos os seus postos de trabalho. Foram 691,9 mil pessoas prejudicadas. Em junho do ano passado, 6.958.484 profissionais trabalhavam no ramo. Um ano depois, eram 6.266.560.
Se a comparação for entre os postos de trabalho de dezembro de 2019 e junho de 2020, a queda é ainda maior, já que o ano de 2019 terminou com mais profissionais (7.137.912 ) na área trabalhand na área.
— Antes da pandemia, o ano que se desenhava era relativamente melhor. A economia por si só estava mais aquecida [desde o segundo semestre de 2019], até que o mundo foi impactado pela necessidade de distanciamento social para enfrentar a Covid — lembra Saron.
Não é possível, porém, comparar os dados deste levantamento com os de anos anteriores, porque esta é a primeira vez que a plataforma Painel de Dados do Observatório Itaú Cultural, criada em abril de 2020, faz um estudo assim. Agora o plano dos responsáveis é seguir acompanhando a série histórica conforme saiam mais resultados da Pnad Contínua. A próxima divulgação, assim, deve ocorrer só depois de fevereiro de 2021.
Informalidade
O levantamento escancara a fragilidade dos trabalhadores informais. Eles foram os mais prejudicados da economia criativa. Eram 2.797.104 em junho de 2019, mas perderam 21,3% de seus postos, caindo para 2.235.114 postos em junho deste ano. Entre os formais, o encolhimento foi da ordem de 6,24% (4.161.380 postos agora contra 4.031.446 antes).
Os pesquisadores atribuem a retração menor, em comparação com os informais, às “políticas de proteção ao emprego implementadas durante a pandemia, que permitiram a diminuição de carga horária e a suspensão temporária de contratos de trabalho, protegendo trabalhadores de possível desligamento”, escrevem na apresentação do estudo.
Pelos critérios da Pnad Contínua, são vistos como formais os trabalhadores com carteira assinada, os servidores públicos e também os profissionais com CNPJ, incluindo MEI (microempreendedor individual). São considerados informais os trabalhadores sem carteira assinada e aqueles que exercem as suas funções por conta própria sem ter CNPJ.
— Com esses dados, a gente vê como é importante profissionalizar ainda mais o mundo da economia criativa e garantir um espaço de formalidade maior. E formalidade não é necessariamente carteira assinada, pode ser também a PJ. Essa estrutura é importante porque, nesses momentos [de crise], de alguma forma, protege o trabalhador de um impacto maior — comenta Saron. — No pós-Covid, vamos precisar trazer a sociedade mais para perto da economia criativa. Ela precisa ganhar consciência de que, quando a gente pensa em economia criativa, arte e cultura, pensa em humanização, em acolhimento, que, claro, são muito necessários, mas estamos falando também de gerar emprego e renda, de desenvolver o país e de ajudar em um desenvolvimento inclusive muito sustentável.