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Patrícia Santos, CEO da EmpregueAfro, acredita que as grandes empresas estão cada vez mais engajadas na inclusão étnico-racial. Mas ela diz que, infelizmente, para alguns, é 'marketing para mostrar que está comprometido com uma causa' Foto: Divulgação

Você Precisa Saber

‘A sociedade não está preparada para uma mulher negra na presidência de uma empresa’, diz Patricia Santos, CEO da EmpregueAfro

No comando da primeira consultoria de recursos humanos especializada em diversidade étnico-racial no país, ela diz que avanço na inclusão de negros no mercado de trabalho é lento e que casos como o da Magazine Luiza cansam quem está na linha de frente: ‘As pessoas são ignorantes, de fato, com o que é inclusão racial no país’

Larissa Medeiros da Celina, jornal O Globo

De acordo com o Instituto Ethos, se o Brasil persistir na caminhada por inclusão em grandes empresas de forma tão lenta e desproporcional quanto nos últimos anos, a igualdade racial no mercado de trabalho só será alcançada daqui a 150 anos. Foi com base neste cenário que Patricia Santos, CEO da EmpregueAfro, primeira consultoria de recursos humanos especializada em diversidade étnico-racial no país, decidiu tentar mudar a estrutura racista no ambiente corporativo. 

— Não dá para a gente esperar isso! Ainda bem que a pauta está emergindo e as empresas estão entendendo cada dia mais o seu papel. Na minha perspectiva mais otimista, eu daria de 20 a 30 anos para conseguirmos atingir um pouco mais de equidade no trabalho — diz ela.

No último mês, uma explosão de críticas sobre o processo seletivo da Magazine Luiza para trainees negros tomou as redes sociais. A avalanche de comentários foi tão grande que chegou à Defensoria Pública da União (DPU) e provocou divergências até entre os próprios defensores, que repudiaram a ação do desembargador Jovino Bento Júnior contra a loja.

Para Patrícia Santos, discordâncias sobre o tema são tão velhas quanto o próprio racismo estrutural que enfrenta. A EmpregueAfro saiu do papel em 2005 e, de lá para cá, demorou muito para ganhar o reconhecimento que ainda hoje é construído: “Eu era a louca de falar que as empresas tinham que contratar negro”, lembra a CEO. Hoje, a consultoria presta serviços de recrutamento, treinamento e workshops para empresas sobre a temática racial.

Em entrevista a CELINA, Patrícia falou sobre o caso Magazine Luiza, a trajetória como mulher negra a frente de um negócio social e o mercado inclusivo para negros.

CELINA: O que sentiu quando explodiu o caso Magazine Luiza nas redes sociais?

PATRICIA SANTOS: No final de semana que explodiu me doía muito. Desisti das redes sociais. Quem está na linha de frente há muito tempo, às vezes cansa de algumas coisas. Por exemplo, o mimimi dos racistas. No caso deles, a gente pode dizer que exalam mimimi. As pessoas são ignorantes, de fato, com o que é inclusão racial no país.

A sociedade brasileira está preparada para uma mulher negra na presidência de uma empresa?

Não está. Eu senti uma desconfiança da nossa competência o tempo todo. Nós temos que provar que estudamos, temos conhecimento e, de fato, sabemos do que estamos falando. Nós temos que desafiar o racismo duas vezes, além de desafiar o machismo que a sociedade já naturalmente vai ter. Primeiro, no caso da EmpregueAfro, temos que vender o nosso serviço e dizer que nós conseguimos encontrar pessoas e entregá-las com excelência. Segundo, para que essas pessoas também tenham o mérito pelas trajetórias e carreiras delas. Diferente da meritocracia, elas precisam de uma oportunidade para mostrar seu talento e seu potencial. Tem dias que eu choro, fico quieta, cansada. Eu me sinto em uma linha de enfrentamento mesmo. É muito pesado!

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Quando entendeu que gostaria de seguir na área específica de recrutamentos étnico-raciais?

Na época em que eu fazia estágio de RH, comecei a perceber que não havia negros nos processos seletivos. A partir disso, procurei literaturas no Brasil sobre a temática, participei de reuniões do movimento negro e de rodas de estudo para entender por que pessoas negras não vinham. Sempre digo que foi uma inquietude pessoal e uma vontade de ver outras pessoas que se parecem comigo, com a minha família e com os meus ancestrais nas mesmas oportunidades que eu tive.

Para você, as empresas estão se adequando para entrar “na onda” da diversidade ou por reconhecerem a necessidade de inclusão em ambientes de trabalho?

As empresas estão tomando ciência. Quinze anos depois da criação da EmpregueAfro, a gente está avançando no tema, principalmente porque grandes empresas estão cada vez mais engajadas. Infelizmente, para alguns, é marketing para mostrar que está comprometido com uma causa. Nós vivemos a onda da diversidade com as causas de gênero, em que mulheres brancas foram beneficiadas para ocupar mais cargos. Agora, vivemos este momento que acredito ser uma emergência de mercado que vem das redes sociais. É um grito do nosso povo que estava abafado por muitos anos.

Qual foi o momento de virada para o mercado de trabalho fazer processos eletivos para pessoas negras?

No ano passado, a EmpregueAfro atendeu 62 empresas. Após a morte de George Floyd, em apenas um mês, 73 empresas entraram em contato conosco para começar projetos. Meu sentimento foi “caramba, precisou acontecer uma desgraça!”. Mas, sem dúvidas, as mortes de João Pedro, em São Gonçalo, do Miguel, em Recife, e de George Floyd sensibilizaram muito as pessoas.

Para você, estamos avançando nas discussões sobre esse tema?

Quanto mais a gente ocupa, mais natural vai se tornando a presença de pessoas negras. Hoje, temos um Ministério Público do Trabalho que está pressionando para incluir estagiários e trainees negros, mas se a gente não tem a força da lei, o ativismo de pessoas únicas e uma pressão nas redes sociais, a gente não consegue que a causa ganhe força.

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