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Cidade Constitucional

Universidade de São Paulo – Escola de Artes Ciências e Humanidades

Cidade Constitucional

Cidade Constitucional – Montevideo – ACH3666
Matheus Pais Portela                               nºUSP: 8919298
Professores: Jaime Crozatti; Marcelo Nerling; Wagner Iglecias

  1. Introdução

A ACH3666- Cidade Constitucional faz parte do rol de disciplinas oferecidas pelo curso de Gestão de Políticas Públicas da Universidade de São Paulo. Consiste, em linhas gerais, em um projeto imersivo que busca aproximar o estudante das estruturas político-administrativas, das políticas públicas de Governo e de Estado e da relação desde com a Sociedade Civil Organizada. Em sua edição de 2015, cerca de 45 estudantes foram levados para a cidade de Montevideo, Uruguai, de 28 de junho à 4 de julho, acompanhado pelos professores Wagner Iglecias, Marcelo Nerling e Jaime Crozatti. Tradicionalmente, a viagem era realizada para Brasília; este ano, pela primeira vez, realizou-se uma viagem internacional. É vontade e intenção geral do curso de manter a disciplina nesse novo molde.

  1. Domingo, primeiro dia – Impressões de Montevidéu

No primeiro dia, sem nenhuma programação acadêmica, os estudantes brasileiros aproveitaram para conhecer os monumentos, prédios e ruas da cidade. O hotel em que se estabeleceram se encontrava na Ciudad Vieja – uma ótima localização –, perto da principal rua da cidade, a Av. 18 de Julio, da Plaza Independencia e da prefeitura. As diferenças para com São Paulo são gritantes. Apesar de concentrar a metade da população do Uruguai, muitas ruas estavam desertas, e só ouvia-se barulho pela passagem de nossa numerosa delegação. Percebe-se que é uma cidade marcadamente turística, com milhares de lojas de souvenirs e restaurantes. As ruas são extremamente bem cuidadas e as calçadas planas. Por outro lado, os prédio e casas não passaram por reformas e se erguem em suas belezas antigas e malcuidadas. Destaca-se, também, as intervenções urbanas na cidade, de maioria de cunho político. Um prelúdio do que veriam nos dias seguintes.

  1. Lunes , segundo dia – UNILAR

No segundo dia, ainda de manhã, rumaram para a Universidad de la República, localizada no Centro. Foram recebidos pelo Dr. Gerardo Caetano, historiador e professor da Universidade, e Rafael Reis, chefe de gabinete do Alto Representante Geral do Mercosul. Os três professores brasileiros se juntaram a eles para compor a mesa de debate.

Rafael, primeiro a falar, conta um pouco sobre a trajetória do Mercosul e de seus atuais desafios. O Bloco, que inicialmente tinha um viés estritamente comercial, foi se expandindo em busca de integração cultural, política e social. Um exemplo dessa busca é o Estatuto da Cidadania do MERCOSUL, que facilita a livre circulação entre os cidadãos do bloco.

Terminada a sua fala, o tema rumou para Modelos e Práticas de cidadania no Uruguai, com Gerardo. O Professor sentiu, logo nos primeiros minutos, qual era a dúvida que os estudantes estavam ansiosos para solucionar: Como o Uruguai aprova políticas publicas tão progressistas se comparadas às da restante da América Latina e ,principalmente, às políticas do Brasil?

O Professor descreve a grande participação popular nas decisões no País. A redução da maioridade penal, por exemplo, foi rejeitada em plebiscito. Gerardo explica que a República sempre foi um símbolo forte no Uruguai, permitindo com que os direitos sejam debatidos e conquistados. A concepção de Direito, acredita Gerardo, tem papel fundamental para esse destaque democrático. Para que sejam compreendidos em suas máximas extensões, todos os direitos devem ser considerados parte dos Direitos Humanos. “Toda violación de derechos es uma violación de Derechos Humanos”, disse ele.

A percepção aguçada dos direitos levou as instituições Uruguaias a conceber uma personalidade fortemente republicana; tornando o País -há muito tempo- um gerador de tendência para o restante da América Latina. A República não é o único símbolo que Gerardo destaca como baluarte do Uruguai. A democracia também é um ideal forte em sua cultura. O Professor ressalta, no entanto, que o discurso democrático deve ser utilizado com cautela; muitos dizem ser democratas, mas fazem coisas terríveis em seu nome. Para alcançar a plena democracia, defende Gerardo, um país deve acabar com a desigualdade; daí, talvez, a principal diferença para o Brasil. O Uruguai, jamais cedendo à apropriação política por alguma elite, obteve a igualdade socioeconômica e, sem surpresa alguma, é um dos países de maior IDH das Américas, com 0,792 no índice (2012).

Gerardo também falou de Pepe Mujica. Por que causa tanto alvoroço e faz tanto sucesso? A sua principal característica, segundo o professor, não são as políticas públicas de esquerda, mas o ideal de democracia que encarna. Para Mujica, o presidente não deve fazer o que quer, e sim o que deve. Nota-se, inclusive, que o ex-presidente não era unanimidade na esquerda do país; suas pautas por vezes eram consideradas moderadas, irritando alguns setores populares. Porém, no fim, disse Gerardo, um presidente democrata é sinal de que uma sociedade civil organizada pode reivindicar temas, e isso era suficiente para a população.

À tarde, no mesmo dia, visitamos a Embaixada no Brasil no Uruguai, localizado no palácio de Pietracaprina. Fomos recebidos por Sr. Cesar Alejandro Garcia Cauci, Ricardo Martins Rizzo e Orlando Celso Timponi. Lá, a delegação brasileira aprendeu sobre o funcionamento do Itamaraty no Uruguai. Além de dar apoio a artistas brasileiros que desejam tocar no País, a embaixada é um polo político e acadêmico, sendo fundamental para a cooperação dos dois países.

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  1. Martes, terceiro dia – DGI e Educação Fiscal

No terceiro dia, a delegação visitou a Dirección General Impositiva ( DGI), que é responsável pelo recolhimento de tributos internos Uruguaios. Inicialmente, assistiram a uma palestra de Gustavo González, coordenador de assessoria Econômica, que abordou as características tributárias do país. Dentre os fatos mais interessantes do orçamento uruguaio, está a baixa evasão fiscal, resultado de uma cultura de cumprimento tributário que não é comum no Brasil. Em seguida, Margarita Faral, da Secretaria Técnica Geral, nos explicou sobre o Plano Ceibal, ferramenta utilizada para o fomento da educação fiscal. O plano fornece computadores com programas que ensinam de forma lúdica sobre valores e atitudes relacionados à tributação a jovens e crianças.

  1. Miércoles, Quarto dia- Sociedade Civil e a Garantia dos Direitos Civis

A programação de Quarta-Feira levou a delegação a casa Pró-Derechos, que abriga três coletivos: Ovejas Negras, Mujeres en el forno e um coletivo ligado a legalização da maconha. Lá, conversaram sobre os direitos reprodutivos da mulher, diversidade sexual e de gênero, redução da maioridade penal e outros assuntos ligados nos quais se também debatem na casa.

       À priori, imaginávamos que os jovens brasileiros teriam dificuldades de comparar a cultura e a política Brasileira e Uruguaia, assim como nós tínhamos. No entanto, eles se mostraram conhecedores de seu País Vizinho. Nota-se, dessa forma, que o Brasil vive em uma ilha cultural na América do Sul, separada pela língua materna e por um histórico imperialista.

Os militantes da Pro-derecho nos disseram que a maior diferença entre os dois Países era, indubitavelmente, o grau de articulação da sociedade. Enquanto os sindicatos no Brasil perdem força, principalmente no período neoliberal do país, no Uruguai o sindicato dos trabalhadores é o maior e mais importante movimento social. Para aprovar a Ley nº 18.426, que garante os direitos sexuais e reprodutivos da mulher, por exemplo, foi fundamental a articulação de coletivos, como o Mujeres em el forno.

Os eixos foram novamente abordados à noite, na Faculdad de Educacion da UDELAR, com Mariana Cherro, Marcelo Rossal e o deputado Sebastián Sabini. Mariana falou sobre o histórico de políticas públicas ligadas aos direitos sexuais e reprodutivos, como o casamento igualitário (conquistada pela Ley nº 19.075) e lei da interrupção voluntária da gravidez. Rossal e Sabini, em suas falas acerca do processo de descriminalização da maconha, ressaltaram a necessidade de criar uma política pública que freasse o tráfico, uma vez que o combate armado não estava funcionando.

  1. Jueves, quinto dia- “Amor? Ora, amor no se habla, se siente”

No quinto dia de projeto, a delegação foi à sede do Parlamento do Mercosul, o ParlaSul, escutar o que Guilherme Rossi tinha a dizer sobre o funcionamento da entidade e da integração latino-americana. O ParlaSul é responsável por debater qualquer assunto comum e de interesse dos membros do bloco. Infelizmente, os Países membros ainda não criaram uma agenda externa; ou seja, as posições tomadas no cenário interno pouco dialogam com a conjuntura da América Latina.

No mesmo dia, a delegação visitou o Palácio Legislativo. Uma vez chegada, a delegação teve a honra de se sentar com o ex-presidente Pepe Mujica. Todos os estudantes estavam apreensivos. Mujica é muito conhecido no Brasil não tão somente pelas políticas públicas progressistas, mas também por sustentar um discurso anti-consumista e transparecer uma imagem de um senhor comum, como se não houvesse se apegado às formalidades do poder. Seu discurso, tanto filosófico quanto político, abordou a parceria com Brasil em temas importantes e a integração da América Latina. A parceria com o Brasil é vista como importante, mas muito aquém do desejado. Sua perspectiva para a América Latina para os próximos 5 anos não é das mais otimistas. A região continua sendo coberta por produtos chineses que, a seu ver, não favorecem os países latino-americanos. Além disso, o fraco desempenho econômico somado a pouca articulação nos blocos representa um perigo para os direitos sociais da América Latina. Ao término de sua fala, o professor Nerling perguntou de modo carinhoso “Nos fale um pouco sobre o amor”. Mujica, com a sinceridade já conhecida em suas aparições públicas, respondeu: Amor? Ora, amor no se habla, se siente.

  1. Viernes, sexto dia – Poder Judiciário e uma perspectiva financeira

No dia 03/04, tomaram rumo ao Palácio Santos, onde se encontra o Ministério das Relações Exteriores. A visita não contava com palestras, porém o guia que os acompanhava enriqueceu as observações com a história por traz de cada tapeçaria, cômodo, monumento e quadro.

Em seguida, visitamos a Suprema Corte, aprenderam um pouco sobre o poder Judiciário Uruguaio. Em sua ótima explicação, ficou ligeiramente visível como o poder Judiciário do País Platino está mais avançado que o brasileiro. Essa diferença entre os judiciários dos dois países, por mais complexa que seja cravar, pode ser sublinhada por duas razões: A agilidade no julgamento dos processos e os salários condizentes com a posição no Poder e com o custo de vida no País. Ao perguntarem se lá havia auxílios aos Ministros ( que eram 5 , na máxima instância), como o auxilio-Terno, o guia saiu de sua arranjo formal e deu uma educada risada.

O último encontro da delegação não foi com um acadêmico ou agente do setor público. Bruno Huertas, antigo aluno do professor Iglecias e agente no mercado de Bolsas, nos recebeu em seu local de trabalho, na noite de sexta-feira. Bruno começa comparando a sociedade brasileira com a uruguaia, mostrando uma consequência – Surreal para nós brasileiros- da forte cultura democrática Uruguaia: O Desapego quanto ao trabalho desmedido. Bruno falava como parou de contratar os uruguaios por não se adaptarem ao ritmo insano do mercado financeiro. Diferentemente do Brasil, os Uruguaios não viam a necessidade de gastar sua vida 8 horas por dia no trabalho, que por vezes se estende até em casa. As lojas costumam fechar cedo, não se sacrifica qualidade de vida por mais lucro. Bruno serviu, portanto, para nos fazer questionar: Por que (ou por quem) trabalhamos tanto?

  1. Conclusão

Ao tomarem primeiro contato com as instituições Uruguaias, os estudantes brasileiros buscavam em cada palestra o segredo do País para ser uma vanguarda progressista há décadas. Ao fim da viagem, felizmente, já haviam desvendado o mistério. As instituições do país se amparam tão fortemente em dois pilares, – a democracia e o republicanismo- que não permitem que sejam apropriadas pelo poder econômico, como tão visto no Brasil. Claro, o lobby ainda é presente, mas com pouco poder se comparado à sociedade articulada. A via democrática foi, provavelmente, uma das razões de a sociedade civil estar tão próxima às instituições e terem um grande peso fundamental na tomada de decisões. As três leis que foram escolhidas como eixos de estudo para a delegação brasileira podem ser consideradas, dessa forma, resultado de uma República que, na contramão da América Latina, é capaz de se aproximar das camadas populares sem correr o risco de ser desarticulada.

Como membro da delegação Uspiana, posso dizer que nenhuma outra disciplina me agregou tanto conhecimento quanto Cidade Constitucional. A rica programação me permitiu imergir completamente no ambiente político uruguaio, entregando a perspectiva da ciência política, da administração publica, do Direito e, por óbvio, da gestão de políticas públicas. Termino meu relatório agradecendo aos três professores que, entre concordâncias e discordâncias, tornaram a viagem épica, inovadora e inesquecível.

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